Rosinha já não está. Desde ontem.

Não é uma rosa mas outra flor, uma flor para uma mulher de sua graça Rosa Maria.
Procurei no meu imaginário e lembrei que, quando cheguei ao seu Serviço em 1974, no Laboratório de Isótopos Abílio Lopes do Rego no IPO de Lisboa, hipotética-secretária-verde-em-experiência e eventual, já Rosa Maria tinha estatuto de Preparadora do Quadro. De certeza com mais uns 15 anos do que eu, criou-se uma empatia entre nós. Lembro-a sempre magra e de cabelo liso, curto e escuro que os anos passaram a grisalho, óculos e cigarro entre dedos, andar miudinho e quase sempre de calças a aparecerem por debaixo da bata branca. Era cordial com os doentes e exigente no trabalho. Assumiu a sua escolha política na ala esquerda. Como eu não tinha medo de quem «comia criancinhas ao pequeno almoço» e «dava injecções atrás das orelhas dos velhos», tinha os ouvidos bem abertos e deixei-me ir na onda. Ser da esquerda era giro. Colar cartazes nas paredes com um grude feito de água e farinha, ocupar por uma noite o possível «infantário de 7 Rios» de modo a transformar um local odiado num bem diferente, assistir às sessões de propaganda política, ir em manifes da função pública, era tudo tão novo e diferente! Foram uns bons anos de luta reivindicativa os anos de 74 a 76. O início de uma nova maneira de estar e sentir a vida, de aceitação de novos comportamentos, de desafios, de amizades e de desaguisados, de aprendizagens ... foi a Rosinha que me vendeu 4 desenhos de Álvaro Cunhal, que emoldurados preenchem uma das paredes cá de casa.(*)Depois fui abrandando. Ela continuou. Sempre que olhar os desenhos vou lembrar que já não estás.
Eu saí e fui para outro serviço mas o acaso encarregou-se de nos promover pequenos encontros dentro dos muros do hospital. Quem se quer bem, sempre se encontra, diz o ditado. Aí trocávamos um olá como vais e uns sorrisos, umas referências a isto ou aquilo e seguíamos o nosso caminho. Foi isto que guardei de Rosinha.
A minha fila vai diminuindo. Os que chegaram primeiro, vão partindo primeiro. Alguns. Outros vão antes de tempo. É a Vida.
Inté Rosinha.

(*) http://www.citi.pt/cultura/artes_plasticas/desenho/alvaro_cunhal/desenhos.html conta a estória dos desenhos.

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