Um fim de semana sozinha. A ler de novo O Principezinho

É meio dia de Domingo. Vim até aqui teclar. Desabafar um pouco. Escrevo sobre a família. E sobre os outros. Aqueles que vamos cativando ao longo da nossa vida.
A família próxima é pequena e tende a reduzir, como é natural e doloroso.
Amigos que consegui cativar contam-se pelos dedos. A maioria começou a não estar. É uma maneira de me aperceber que avanço na idade e que quanto mais velha estou, mais possibilidades tenho de assistir à partida deles. Os jovens não têm a percepção dessa realidade. De que não vivemos para sempre.
Dos que ouço duas ou três vezes por ano, geralmente em dias de comemorações, são sempre uma fonte de recordações e falamos como se nos tivessemos olhado de véspera. Quando eu preciso de algum, sempre contei com a sua disponibilidade e ajuda. E ele conta comigo. Não há outra maneira de eu viver a vida, nem eles, por isso nos cativámos. Quase todos pertencemos à mesma geração, a mioria com mais meia dúzia de anos, outros com maior diferença na idade, muito poucos os mais novos. Quando eles partem, eu choro. Mas o trigo dourado estará, para eu os lembrar.(1)
O meu maior repto é para os da geração seguinte. Tenho alguma dificuldade em prender os meus mais novos. Que de meus só têm consanguinidade ou ordem formal e explícita da Lei. Refiro-me, claro está, aos sobrinhos. Quando eram novinhos, eu crei os laços mais ou menos apertados com os esses Principezinhos. Com o passar dos anos, agora uma, mais uns anos e vai outra, eles cortaram esses laços, assim, sem mais nem menos. Deixaram esta Tia pendurada nas recordações. Por vezes sinto-me muito só, sinto-lhes a falta, desejo até que o tempo voltasse para trás quando os olho nos cliques fotográficos que tenho espalhados pela casa e em álbuns. Não compreendo o porquê.
E o que preciso fazer?(2)
.....*.....
(1) «Julgava-me muito rico por ter uma flor única no mundo e, afinal só tenho uma rosa vulgar...
Foi então que apareceu uma raposa.
- Olá, bom dia! - disse a raposa.
- Olá, bom dia! - respondeu delicadamente o principezinho.
- Anda brincar comigo - pediu o principezinho.- Estou tão triste...
- Não posso ir brincar contigo - disse a raposa.
- Ainda ninguém me cativou... Andas à procura de galinhas?
- Não, ando à procura de amigos. O que é que "cativar" quer dizer?
- Quer dizer que se está ligado a alguém, que se criaram laços com alguém.
- Laços?
- Sim, laços - disse a raposa - Eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo e eu serei para ti, única no mundo... Tenho uma vida terrivelmente monótona... Mas se tu me cativares, a minha vida fica cheia se Sol. Estás a ver, ali adiante, aqueles campos de trigo? Não me fazem lembrar de nada. É uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Então quando eu estiver cativada por ti, vai ser maravilhoso! Como o trigo é dourado, há-de fazer-me lembrar de ti
(2) «- Só conhecemos as coisas que cativamos - disse a raposa. - Os homens, agora já não têm tempo para conhecer nada. Compram as coisas feitas nos vendedores. Mas como não há vendedores de amigos, os homens já não tem amigos. Se queres um amigo, cativa-me!
- E o que é preciso fazer? - perguntou o principezinho.»
(1) e (2) - Saint-Exupéry, O Principezinho, Ed. Circulo de Leitores, 1987, Tradução de JMV

2 comentários:

Eliane F.C.Lima disse...

Minha cara Guidinha,
Também tenho sobrihos que mal vejo ou ouço. E às vezes me sinto como você. Mas também me consolo e compreendo: é que eles estão vivendo a primeira parte da vida, quando a gente batalha e não tempo para nada. Eu, que já estou aposentada e vendo a vida, sobra-me mais tempo para sentir saudade. Quem sabe é isso?
Como é a você que o tempo deve sobrar mais, mande um e-mail, pelo menos. Eles precisam saber que são lembrados.
Eliane F.C.Lima

Guidinha Pinto disse...

Não é só pena que eu sinto, lamentos que tenho. Não! A minha indignação é total. Porque até os mails que lhes envio, não têm sequer resposta. Mais que a indiferença, é a total falta de educação. E o mais velho está nos quarenta's o mais novo 13 anos ... !
Entendeu agora porque fico triste de vez em quando? :)
Obrigada Eliane, pela sua compreensão e «paninhos quentes no doidói».
Beijo.