Alguém que me lê se lembra?

Eu sou do tempo de não existirem subsídio de férias e 13º. mês.
Aliás, subsídios eram coisa que não existiam porque não vivíamos num Estado Social. Foi graça ao término do regime político do estado novo, em 25 de Abril de 74, que a pouco e pouco fomos evoluindo à custa de reivindicações, manifes e algumas greves pelo trabalho igual, salário igual (as mulheres ganhavam menos), a diminuição do horário de trabalho diário bem como a bem vinda semana inglesa (semana de trabalho que excluiu o sábado à tarde), a atribuição de mais dois ordenados por ano, e otras cositas más.
No início da minha independência monetária, vulgo trabalho, que iniciei em Dezembro de 1971, os funcionários da edilidade lisboeta dos quais eu fazia parte interinamente, receberam um bodo natalício. Havia uma lista nominal e o meu nome constava. Eu tinha de ir recebê-lo. Lembro-me muito bem. No final da manhã de 24 de Dezembro lá estávamos todos em fila, colegas que nem conhecia eram a maioria, escada acima nos Paços do concelho, a maioria com um sorriso estampado, até chegarmos ao «bom doutor vereador» que nos estendia a mão num voto de feliz natal e outro não doutor que ía passando para as nossas mãos um volume de algum peso! Eu, que já nessa altura não podia com uma gata pelo rabo, carreguei-o até a casa (a de meus pais) toda contente e admirada por em tão pouco tempo de trabalho, ser mimoseada pelo «patrão». Pensava eu que eram iguarias, mas não. Abrimos a caixa. O conteúdo assemelhava-se muito ao que hoje nos pedem para contribuir, para o banco alimentar contra a fome, quando aceitamos o saco de plástico, à entrada de um hiper qualquer. Lembro-me da caixa aberta e em vez da aceitação, a aflição da senhora minha mãe, preocupada com as palavras que o senhor meu pai vociferava - que metessem aquilo num certo sítio, que não andávamos a pedir, que é que eles pensavam que ele era e outros mimos - por causa aquela coisa que carreguei com dificuldade desde o município até a casa, de metropolitano, no natal de 1971. Eram dela sempre as mesmas palavras, durante anos: «Ai meu deus fala baixo J. que te podem ouvir»!
E eu, sem entender nada de nada daquela irritação, não soube como reagir nem fiz qualquer pergunta. Quem não faz perguntas, morre estúpido.
A ignorância, a falta de liberdade e a estupidez entristecem-me, ainda hoje. Porque vivemos num País livre, mas que continua iletrado, ignorante e agora com falta de carácter.
A velha e endémica esperteza virou uma coisa muito mais feia.
Já passaram mais de 30 anos.
Hoje, nem para bodos a edilidade tem dinheiro ...
Pois é.
Lá estou eu a ficar cansada.
Bom fim de semana.

2 comentários:

Adriano Filipe disse...

Bom dia Amiga
Se me lembro,e de muito mais,às vezes dá-me ganas,por ver tanto retrocesso.
Bom fim de semana

Abraço

Guidinha Pinto disse...

Obrigada amigo Adriano.
Boa semana.
Abraço.